sábado, 10 de abril de 2010

JACKSON DO PANDEIRO - UM TEMPERO QUE FAZ FALTA NO GOSTO DA MPB



Uma das figuras de maior expressão na história da música nordestina, é Jackson do Pandeiro, com muita justiça chamado de “Rei do Rojão”, “Rei do Ritmo”, “Rei da Divisão”, este último, por haver sido considerado um mestre em dividir os versos, com uma ritmica, um molejo, uma bossa curiosa, diferente, no domínio de sua interpretação.
Conhecedor profundo de suas raízes folclóricas e tradições musicais, utilizava a voz como um verdadeiro instrumento musical. Tanto que, quando surgiu para o Brasil na década de 50, logo ganhou o respeito e a admiração de nomes já consagrados tais como Luiz Gonzaga, Manezinho Araújo, Luiz Vieira, mais um outro Luiz, o Bandeira, Fernando Lobo, Ari Barroso, só para citar alguns.
Nascido José Gomes Filho, paraibano de Alagoa Grande, veio ao mundo no dia 31 de agosto de 1919 e foi criado num ambiente completamente musical já que em sua casa todos tocavam algum instrumento. Ele próprio, já aos sete anos, acompanhava a mãe, Dona Flora, tocando zabumba nas tiradas de cocos e nos improvisos que ela, folclorista, criava em suas andanças em feiras e festas populares.
Após o falecimento do pai em 1932, mudaram-se para Campina Grande, cidade próspera da Paraíba e lá, o menino José, para ajudar em casa, arrumou emprego como “cassaco de padaria”. Emprego que só largou em 1936, já então contando 17 anos, para substituir o baterista de um conjunto dançante que animava festas no Clube Ipiranga daquela cidade.
Por essa época, devido à magreza que o assemelhava ao ator de cinema Jack Perry, adotou o nome artístico de Zé Jack. Era, então, um ritmista de destaque na região, sendo logo contratado para compor o regional da Rádio Tabajara de João Pessoa, a capital do Estado.
Em 1948, com a inauguração, no Recife, da Rádio Jornal do Commercio, tranferiu-se para lá, contratado que foi como ritmista e fazendo parte de vários conjuntos musicais da emissora. Foi aí que resolveu trocar seu nome artístico para Jackson do Pandeiro, com o qual tornou-se conhecido em todo o país.
Enquanto integrante da Rádio Jornal do Commercio, fez dupla com o compositor Rosil Cavalcanti, um pernambucano de Macaparana, nascido a 20 de dezembro de 1915 e falecido misteriosamente, em Campina Grande, Paraíba, a 10 de julho de 1968. Foi Rosil, o criador de sucessos marcantes de Jackson, como é o caso de “Sebastiana”, cuja letra diz:
“Convidei a comadre Sebastiana
Pra cantar e xaxar na Paraíba.
Ela veio com uma dança diferente
E gritava que só uma guariba...”
Um outro sucesso foi “Cabo Tenório”:
“Cabo Tenório
É o maior inspetor de quarteirão
Na casa de Tota
Fizeram um forró
Tenório foi só
Dançar e beber.
Os cabras de lá
Quiseram lhe bater
Tenório gritou, Virge!
Vai ter confusão.
Balançou a mão
Deu murro e bofete
Tomou canivete
Peixeira e facão.
Os brabos correram
Quem ficou presente
Gritava contente
No meio do salão e dizia:
Cabo Tenório
É o maior inspetor de quarteirão...”

Ainda outro sucesso foi “Na Base da Chinela”, cujos versos dizem:
“Eu fui dançar um baile
Na casa de Gabriela
Nunca vi coisa tão boa
Foi na base da chinela...”
O mesmo caminho de sucesso percorre “Forró do Zé Lagoa” e muitos outros que firmaram definitivamente o nome de Jackson do Pandeiro no panorama artístico nacional.
Um outro pernambucano teve influência marcante no início da carreira de Jackson, o recifense, nascido a 7 de abril de 1922 e falecido em dezembro de 1995 na Cidade Maravilhosa, Edgar Ferreira, autor de sucessos tais como “Forró em Limoeiro”, cuja letra começa assim:
“Eu fui pra Limoeiro
E gostei do forró de lá
Eu vi um caboclo brejeiro
Tocando a sanfona e entrei no fuá...”
Também a música intitulada “Um a Um”, cujo refrão ecoou na voz do povo e que fala de uma paixão nacional, o futebol:
“Esse jogo não é um a um
Se meu clube perder há zum, zum, zum...”
E ainda “Eu vou Gargalhar”:
“Quem disse que a escola não sai
Não tem cabeça pra pensar.
A escola vai sair
O povo daqui lá vai sambar
Vou gargalhar quá, quá, quá, quá...”
Gravando pela etiqueta Copacabana, Jackson foi levado pela direção da gravadora, ao Rio de Janeiro onde, após diversas apresentações na então Capital Federal, foi contratado pela Rádio Tupy, passando, em seguida, a compor o elenco de estrelas, o maior à época, da Rádio Nacional.
Enquanto ainda no Recife, fizera dupla com Almira Castilho, cantora de mambo e dançarina de rumba, com quem veio a se casar depois, passando a cantar e dançar juntos, côcos, rojões, xaxados, baiões.
Já no sul do país, ao lado da companheira, popularizou o forró, coreografando-o, colocando-lhe uma pimenta própria, um sabor bem mais legítimo e característico, até então pouco explorado por nordestinos envolvidos com o campo musical.
Seu talento passou, daí por diante, a ser reconhecido em todo o país e um grande número de compositores de sucesso dispôs-se a compor para ele. Entre esses nomes, e só para citar alguns, encontram-se os de João do Valle, Gordurinha, Genival Macedo, Onildo Almeida, Rui de Morais e Silva, Manezinho Araújo, Venâncio e Corumba, Zé do Norte, Paulo Gracindo.
Ao final da década de 50 e início da de 60, Jackson excursionou por todo o Brasil, apresentando-se também em São Paulo, onde o número de Nordestinos ali residentes, já era então, bastante expressivo, nas maiores emissoras: Rádios Record, Bandeirantes, Tupy e Nacional.
Sua popularidade foi mais uma vez confirmada e a música nordestina, sempre mais aceita, era também solicitada, tanto pelo seu humor quanto pela criatividade e conteúdo social e folclórico. Tanto que, ainda na década de 60, Gilberto Gil, um dos líderes da nova geração, à época, regravou “Chiclete com Banana”, de Gordurinha e “O Canto da Ema”, de João do Valle. Da mesma forma, Gal Costa regravou “Sebastiana”, de Rosil Cavalcanti e do próprio Jackson. Era a geração dos festivais prestigiando o paraibano que colocara tempero na estrutura melódica e concedera um novo balanço à música nordestina.
Luiz Bandeira, famoso compositor brasileiro, afirmou, certa vez, que “Jackson parece que tem um pandeiro na garganta”, exaltando assim a sua intimidade com o ritmo e com o instrumento que lhe originou o cognome.
Em 1967, Jackson separou-se, definitivamente, da parceira e esposa Almira Castilho, desfazendo-se a dupla. Passou, então, a atuar na Rádio Globo, de grande audiência, ao lado do animador Adelson Alves; continuou gravando músicas juninas e carnavalescas, animando bailes e forrós, apresentando-se em emissoras de rádio e TV pelo Brasil a fora.
Em 1982, cansado e doente, foi internado às pressas, em coma diabético, no Hospital Santa Lúcia, em Brasília, onde fizera uma apresentação na noite anterior. Resistiu ainda alguns dias, a doença foi mais forte. Veio a falecer de embolia cerebral no dia 10 de julho daquele ano.
Três dias após a sua morte, escreveu o jornalista José Neumanne Pinto no Jornal do Brasil, lembrando a sua figura de “grande” esquecido da M. P. B: “(...) Reduzido ao mercado de músicas juninas, Jackson vivia momentos de glória apenas, quando chamado por seus amigos artistas (como Alceu Valença e Geraldo Azevedo, seus fãs), para shows e participações em discos. Chegou até a funcionar como ritmista de um artista menor num festival da Globo, tamanha era a distância entre seu talento e o reconhecimento que dele tinham as gravadoras e as emissoras de rádio e televisão. (...)”
Tal qual ocorreu com outro rei, o do baião, o trabalho de Jackson serviu e serve ainda, de escola, de fonte de inspiração e de estilo aos novos talentos. Espelho dos que se dedicam a um campo musical tão rico e criativo quanto o da música nordestina, na qual, Jackson do Pandeiro, historicamente, preencheu algumas das páginas mais importantes. Renato Phaelante
Pesquisador Fonográfico da Fundaj

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